sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Lobato e o racismo no Brasil

Comento com algum atraso a polêmica que envolve o livro "Caçadas de Pedrinho" (capa ao lado), do escritor paulista Monteiro Lobato. Desde o final de outubro, o Conselho Nacional de Educação (CNE) proibiu a circulação do livro em escolas sob a alegação de que seu conteúdo incita ao racismo.

No último dia 04/11 (mas eu só li hoje) a Academia Brasileira de Letras convocou uma reunião para discutir o tema e a posição dos membros da instituição foi de rechaçar tal proposta. Como se pode ler no site da Academia, "a Casa manifestou repúdio contra qualquer forma de veto ou censura à criação artística" e declarou também que “cabe aos professores orientar os alunos no desenvolvimento de uma leitura crítica."

A mim o que parece chocante é a mudança dramática de discurso das pessoas que coordenam a educação neste país. Senão vejamos: quando descobriram o pré-sal, louvaram o autor pela sua luta em prol da exploração do petróleo. E Lobato também foi louvado quando, nos EUA, elegeram Barack Obama e todas as pessoas fizeram referência ao livro intitulado "O presidente negro ou o Choque das raças".

Agora que essas coisas já se converteram em notícia velha, decidiram que o autor não é mais digno de louvores e então aplicam uma leitura anacrônica e com pretensão de ser politicamente correta a um livro que ele escreveu. Como se Lobato fosse o culpado por toda a discriminação que existe no Brasil.

E o cúmulo do absurdo: post-mortem o autor precisa de defesa da ABL, Casa onde ele se recusou a entrar porque não fazia seu estilo estar sentado discutindo coisas. Lobato queria fazer coisas. E as fez muito bem. Eu  tenho só 24 anos, mas os livros dele também fizeram parte da minha formação e em nenhum momento me senti discriminado em minha condição de afro-descendente pelo fato de Tia Nastácia ser negra e às vezes receber um tratamento "racista" por parte dos meninos, de Emília ou de Dona Benta. Para mim, isso tudo é conversa fiada.

Em tempo: a imagem que coloquei neste texto é da edição da Editora Brasiliense, que lamentavelmente já não detém os direitos de publicação. Me recuso a colocar a capa da edição atual (da Editora Globo) porque o que eles chamam de "novo projeto gráfico" é, na minha opinião, um assassinato à obra do autor.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

CELU: sea lo que Dios quiera!

Na última sexta-feira estive em Córdoba outra vez (acho que Córdoba é a minha segunda cidade aqui na Argentina) para fazer a prova aplicada pelo governo argentino para obtenção do CELU - Certificado de Español Lengua y Uso. O resultado só sai em dezembro e, até lá, preciso controlar a ansiedade. Apesar de que, se eu pensar bem, minha ansiedade não vai mudar em nada o resultado. Assim: seja lá o que Deus quiser! Ou, para me sentir melhor no uso do idioma: ¡sea lo que Dios quiera!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Apresentando o Brasil (3)

Apenas para constar que sigo na empreitada de mostrar alguma coisa da minha terra aos hermanos, deixo o link para um evento que será realizado no próximo dia 12/11 aqui na Universidad Nacional de Villa María. Na ocasião apresentarei alguns apontamentos sobre a atuação de escritores e intelectuais brasileiros ao longo dos séculos XIX e XX: http://www.unvm.edu.ar/index.php?mod=noticias&id=1362

terça-feira, 2 de novembro de 2010

¿Testemunha da História?

Sei que comento com atraso a morte de Néstor Kirchner. Neste espaço, que deveria conter - entre outras coisas - as minhas impressões sobre o intercâmbio na Argentina, creio que é pertinente colocar alguma notícia sobre a morte do ex mandatário do nosso país vizinho.

A morte de Kirchner foi um acontecimento nacional, como normalmente ocorre na "nossa América". Na TV Pública (e depois me disseram que em canais particulares também) simplesmente deram cobertura TOTAL ao fato, com imagens e entrevistas ao vivo o dia inteiro. Foram decretados três dias de luto oficial e todo tipo de evento (inclusive uma série de conferências sobre o escritor Manuel Mujica Lainez) foi cancelado e eu que tinha interesse em participar fui pego de surpresa duas vezes...

Muita gente aproveitou para alfinetar o grupo Clarín e dizer que as pessoas que estavam nas ruas apoiando Cristina sabem que o governo é mais do que dizem "os grandes meios de comunicação".

Na quarta-feira passada era feriado aqui, por causa do Censo 2010. Só faltou chover para que o dia fosse mais triste.

Mesmo com o cancelamento da atividade literária, eu tinha vontade de ir à Capital Federal para tomar parte no velório. Não que eu me sentisse comovido como as pessoas daqui. Mas me atraía a idéia de ser "testemunha da História". Acabei desistindo à última hora por medo de tumultos na Plaza de Mayo,  abarrotada de gente.

Ao escrever este texto, vejo que, de alguma maneira, o simples fato de estar aqui na Argentina já me faz "testemunha da História" ou, quando menos, me permite ter uma visão que muitos brasileiros não tiveram. E vejo que não nos damos conta de que estamos "testemunhando a História". Ser testemunha envolve uma participação e um sentimento e uma vivência que são muito mais e vão muito além de um movimento simulado.

sábado, 23 de outubro de 2010

Minha hora da estrela

Desde longe, a voz de meus familiares é como a Rádio Relógio a que se refere Rodrigo. Não posso, ao contrário de Maca, ouvir todos os dias, mas sempre que ouço é um misto de alegria e de susto.

As gotas de minuto são os muitos centavos que se escoam enquanto ouço algumas palavras de pai, mãe, irmãs. Sem música e às vezes com anúncios publicitários. 

Ao contrario de Maca, acho que sei que tenho uma vida interior e me assusto ao ouvir o português e saber que pouco a pouco ele se me vai perdendo em meio ao espanhol de cada dia, mesclando-se num "portunhol" que eu achava impossível... e me assusto com as notícias que meus familiares me transmitem.

Gente de todos os círculos de convivência, vizinhos, amigos, parentes, gente da Igreja, do ex-emprego, da faculdade, vizinhos de minha avó, afetos e (ex) desafetos - e agradeço à distância pelo parênteses -; gente de todas partes acompanha essa espécie de "saga" em que se converteu a minha ousada temporada de estudos internacionais. De um golpe me dou conta de que sou o primeiro Assis e o primeiro Augusto (dessas ramas que me constituem, por suposto) a cruzar fronteiras. 

Ao descobrir que acompanham meus movimentos, penso se não os estou simulando de alguma maneira. Aqui morre o rapaz responsável, que se desdobrava entre o trabalho e o estudo, e nasce a estrela.

O mais aterrador em tudo isso é saber que de algum modo já fui "empurrado" por um carro em alta velocidade. Não foi um Mercedes amarelo; o que se trombou comigo foi o nascimento prematuro de uma priminha de terceiro grau.

A menina veio ao mundo no mesmo sete de setembro em que eu me convulsionava por fazer aniversário longe de casa, sem feriado e sem as visitas e programas previsíveis. O fato de ela nascer no mesmo dia que eu, de ter um nome que me pareceu lindo e de representar, a longo prazo, uma possibilidade de aproximação com parentes que de algum modo estão distantes me encheu de um sentimento muito nobre e muito bom. Um estado de graça.

No entanto, ela nasceu com problemas sérios de saúde. Lavínia morreu há quinze dias sem que eu ficasse sabendo no momento mesmo em que isso aconteceu, no "instante-já" em que sua alma se desprendeu deste mundo. A Rádio Relógio me ofereceu uma notícia velha, mas que cortou como a lâmina de um punhal. Ao ouvi-la, choquei a cabeça com a quina dura da realidade.

Villa María, Argentina, 20.10.2010

terça-feira, 19 de outubro de 2010

O falso puritanismo dos brasileiros

Desde longe (estou na Argentina fazendo intercâmbio) tenho acompanhado as discussões pouco frutíferas que se tem produzido no campo político brasileiro em torno à legalização do aborto e o quanto isso pode influenciar no voto de setores religiosos.

Sinceramente, dá asco esse tipo de pantomima que está sendo representada. No Brasil (diziam há tempo atrás que é o maior país católico do mundo...) as coisas ficam só no discurso. Se realmente estivessem todos "a favor da vida", teríamos clínicas clandestinas onde se pode realizar um aborto impunemente?

Se realmente estivessem todos "a favor da vida", teríamos medicamentos abortivos sendo vendidos em farmácias, a meia voz, a escondidas? Eu acho que não.

Por tudo isso, independente de votar em Serra ou em Dilma, o que o povo precisa fazer é cobrar um projeto político real e consistente. De que adianta fingir que é religioso e consciente se sabe que faz uma coisa que é todo o contrário do que diz e sente?

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Uma viagem se faz com malas e livros

Entre minhas leituras na Argentina está a Revista Cultural Ñ, do grupo Clarín que compro quase todos os sábados com a finalidade de inteirar-me de assuntos culturais e, em último caso, ampliar minha capacidade de leitura e escrita em castelhano. Mas vamos ao que interessa:

No último sábado, 09.10, um artigo de uma página contava as peripécias de quem leva livros em viagens e às vezes deixa de aproveitar o passeio lendo ou, ao contrário, carrega peso à toa porque termina aproveitando o passeio e não lê. Também trata daquelas pessoas que compram livros sempre que viajam. De alguma maneira, me vi retratado no texto e gostaria de compartilhar com os leitores deste espaço que realmente comprar livros é uma tentação quando se está viajando, principalmente viajando por outro país.

Seja pelo preço (aqui na Argentina o câmbio me favorece um pouco...), seja pelo autor (vir à Argentina é uma boa possibilidade para comprar Borges, Cortázar, Sábato e outros autores que nasceram por estas bandas...), seja por casualidade (em uma livraria, buscando um determinado livro, olha-se para o lado e se apaixona por outro e levam-se os dois...). Que acham de tudo isso?

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Cinema argentino (3): Igualita a mí

Minha outra incursão pelo cinema argentino foi a película Igualita a mí (Argentina, 2010, 108 minutos), que fui ver no cinema aqui de Villa María, junto com Luis, Gonzalo, Carolina e Daniel. Cada entrada custou $ 20 (vinte pesos, aprox. R$ 10) e esse valor me pareceu bastante caro, ainda quando penso que equivalem a dez reais. Em todo caso, como não freqüento muito os cinemas brasileiros, nem tenho idéia de quanto custa uma entrada para fazer uma comparação e uma valoração mais justa. Mas, vamos ao filme.

Trata-se de uma comédia que narra as peripécias de um solteirão na casa dos 40 anos que vê sua vida mudar radicalmente ao descobrir que tem uma filha, já adulta, concebida muitos anos antes em uma viagem à Bariloche. Para ajudar, a filha aparece em sua casa já grávida.

Apesar de ser um tanto longo para uma comédia, o filme convence e cumpre sua missão de fazer rir. Prova disso foram as sucessivas ondas de riso que se espalharam pela sala de exibição nos momentos mais engraçados. Ondas estas às quais me somei de bom grado. O único senão do filme, na modesta opinião do autor destas impressões de viagem, é o final: por que o protagonista tinha de se conformar com a chegada da idade e da neta e converter-se num exemplar patriarca?

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Voltando aos meus tempos de criança: Museo Barrilete

Em minha segunda passagem por Córdoba, em meados do mês passado com alguns amigos, visitei o Museo Barrilete. Instalado na parte baixa de uma usina desativada, o espaço possui uma proposta interessante: ensinar ciências através de jogos e brincadeiras nos quais princípios de física e química estão envolvidos. A entrada custa $ 16 (dezesseis pesos, aprox. R$ 8) e vale a pena pagar, mesmo que, como eu, você não seja exatamente uma criança em idade escolar. Para mais informações, acesse: http://www.museobarrilete.com/

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Apresentando o Brasil (2)

Apresentei na aula de "Lingüística del Texto y Análisis del discurso" alguns slides sobre o estado de Minas Gerais. A intenção primeira era que eu e Andrej (o alemão que faz intercâmbio nessa mesma universidade em que estou) apresentássemos algum aspecto dos nossos respectivos países. Depois de pensar numa apresentação sobre as músicas brasileiras (com o louvável objetivo de provar que temos outras canções além de "Aquarela do Brasil"); decidi mudar meus planos e falar sobre meu estado natal, que, por não ter praias, é desconhecido por muitos argentinos.

[PÓS ESCRITO][30/09/2015]

Em um desses impulsos de retomada que me é característico, voltei a este espaço e vi que o link para incorporar os slides em questão aqui ao blog já não funcionava. Eles estão ainda disponíveis na minha conta do Slideshare: http://pt.slideshare.net/ailtonjf

E sempre a língua de um país...

E aqui vou me contradizer com relação ao que disse da postura da Ivete Sangalo. Para quem não leu, acho que a moça está certa ao continuar cantando seu repertório em português, sem render-se às pressoes mercadológicas que quereriam impor versões em inglês. Quer dizer, não é exatamente uma contradição, mas eu já inicio o texto dizendo que é para evitar que outros me acusem. Mas, a propósito de que vem tudo isso? Vem por causa de uma viagem recente que fiz a Buenos Aires (Argentina) e da sensação que experimentei ao topar com outros turistas brasileiros, em viagem no exterior.

Os fatos: estou há dois meses fazendo intercâmbio na Argentina. Antes de me decidir a encarar uma temporada no estrangeiro, tive de estudar dois anos o idioma castelhano para não chegar aqui e morrer de fome por não saber pedir a comida. Ainda que algumas coisas formem parte de uma comunicação simbólico-gestual universal, não é seguro arriscar. Além do mais, só com gestos eu acabaria ou comendo sempre as mesmas coisas ou comendo qualquer coisa.

Em Buenos Aires, cidade grande e cosmopolita, que atrai uma quantidade considerável de turistas, encontrei bastantes brasileiros, porque o câmbio, no momento, nos favorece. E encontrar compatriotas em outro país, antes de alegrar-me, me deixou com uma sensação difícil de descrever.

Porque todos os brasileiros que eu vi (tanto em lojas quanto em restaurantes), não sabiam sequer falar bom dia ou pedir um desconto em castelhano. Para diminuir o preço das mercadorias, tentavam todo tipo de expediente, fingindo um desentendimento que estava muito além das eventuais barreiras lingüísticas.

Além disso, num arroubo que tem muito que ver com a idéia de Brasil Grande, tentam pagar tudo em reais, sem sequer se preocupar com perguntar antes se aceitam, como aceitam e com qual valor. E depois reclamam porque o dono da loja está pagando menos que o valor indicado nos jornais...

Conclusão (ou das sensações que não sei explicar): desde que cheguei na Argentina, quando digo que sou brasileiro, me fazem perguntas sobre o presidente Lula. Embora pessoalmente eu seja contra o paternalismo de sua política, que transforma uma quantidade considerável de brasileiros em massa de manobra eleitoral; aqui sou forçado quase cotidianamente a conviver com a imagem de um líder carismático, que prega a união dos países latino-americanos e uma relativa insubmissão frente a EUA e Europa.

Contudo, como e de que modo se pode lograr essa tal "integração latino-americana" (na qual eu próprio passei a acreditar) se nos trâmites mais diários e mais banais do turismo em um país vizinho, as pessoas se fecham no seu próprio idioma, seguindo uma tendência histórica a criar barreiras lingüísticas entre países que estão próximos e compartem histórias e dramas em comum?

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Apresentando o Brasil

Posto aqui um texto que apresentei na aula de "Historia social, política y económica latinoamericana" da Universidad Nacional de Villa María e no qual tento mostrar uma outra visão do Brasil, que está além dos estereótipos que nós normalmente apresentamos ao mundo.

O texto responde a uma crença minha de que cada brasileiro que viaja deve, de alguma maneira, apresentar um Brasil que seja mais que o Brazil das películas estadunidenses, que seja mais que as praias, caras, bocas e bundas das novelas.

Peço desculpas por estar em castelhano, mas me falta ânimo para traduzir ao português. E é bom mesclar os dois idiomas, já que meus eventuais leitores argentinos sempre topam com um blog todo em português que pode lhes custar um pouco a ler.

Literatura y música brasileñas como indicadores de la identidad nacional

Este trabajo tiene por objetivo presentar las distintas visiones que los artistas brasileños tienen de su país como tierra de múltiples razas a partir de la lectura crítica de romances, poemas y canciones que forman parte del imaginario común del país.

1. Primeras ideas de nación mestiza: el país como fruto de la unión de blancos e indios. Literatura de conformación del imaginario colectivo.

En 1873, el escritor brasileño Machado de Assis, señalaba en un texto (“Instinto de nacionalidade”) que se hizo antológico:

“quem examina a atual literatura brasileira reconhece-lhe logo, como primeiro traço, certo instinto de nacionalidade. Poesia, romance, todas as formas literárias do pensamento buscam vestir-se com as cores do país, e não há como negar que semelhante preocupação é sintoma de vitalidade e abono de futuro.”

Lo que se puede desprender de las palabras del autor de “Dom Casmurro” es que la literatura brasileña a partir, sobretodo, del siglo XIX, estaba preocupada en establecer un legado cultural que tuviera la apariencia de nacional. El proyecto literario de los autores era constituir un patrimonio simbólico que después fuese convertido en herencia para las generaciones futuras. Existía la intención de poblar un imaginario colectivo con mitos, imágenes, héroes...

De Juiz de Fora para o World!

Confirmando o status de atração turística que a condição de estudantes estrangeiros nos confere, foi feita uma entrevista comigo e com Andrej para podermos dizer o que achamos da Universidade Nacional de Villa María. A referida entrevista foi realizada no mesmo dia em que estivemos na reitoria da universidade para uma recepção oficiosa pela vicerreitora. Quem puder, assista, é curtinho!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Cinema argentino (2): Cuestión de principios

Minha segunda incursão pela produção cinematográfica argentina foi em casa de uns amigos que fizemos aqui em Villa María: Gonzalo e Daniel. Normalmente vamos à casa deles nas quartas-feiras à noite (pelo que sou muito agradecido) e quase sempre a programação inclui jogar Play Station. Vez por outra, inclusive porque sou avesso ao brinquedo modernoso, vemos filmes.

E numa dessas quartas-feiras vimos "Cuestión de principios" (2009, Argentina, 115 min.), uma película muito divertida que trata, como diz seu título, de uma questão de princípios. Serei mais explícito: uma questão de confrontação entre os princípios de Castilla, funcionário idoso de uma empresa, e os de Silva, seu novo gerente, um yuppie que acredita que tudo tem um preço.

A trama se arma a partir de algo simples. Silva coleciona uma antiga revista espanhola e lhe falta um número para completar sua coleção. Por casualidade, Castilla possui o exemplar que lhe falta, porém não está disposto a vendê-lo porque neste exemplar está uma foto de seu pai com o rei de Espanha e a revista tem para ele um valor sentimental.

Os escrúpulos do velho Castilla desconcertam o gerente, que faz de tudo para forçá-lo a vender a revista, inclusive apelar para a esposa de seu funcionário, a quem os princípios do marido incomodam muito por forçá-la a uma "vida de privações".

Vale a pena conferir o que ocorre antes de que Castilla "se decida" a vender a revista e o que vem depois. Não que eu faça mistério (até porque é uma comédia), mas seria uma pena estragar o final da história contando-o aqui. Para quem tiver interesse, indico a página oficial do filme: http://www.cuestiondeprincipio.com.ar/

Crédito da imagem: http://www.filmaffinity.com/es/film146673.html

Cinema argentino: Carancho

Estar em outro país para um intercâmbio envolve mais coisas que simplesmente estudar todos os dias na universidade. Uma das maneiras de conhecer esse outro país é se acercar às suas manifestações culturais. No caso da Argentina, não penso propriamente na literatura, que com Borges e Cortázar (para citar apenas dois) já ultrapassou fronteiras e, creio, os brasileiros conhecem. Ao menos de ouvir falar.

Mas, do cinema argentino, me parece que falta conhecimento. E falo por experiência própria. Eu não
tenho lembrança de haver visto anteriormente alguma película dos "hermanos". Apesar disso, as que vi aqui me pareceram bastante razoáveis.


A que vi primeiro chama-se "Carancho" (2010). Foi exibida em um café aqui de Villa María chamado Sol & Luna; um espaço interessante e acolhedor onde, às quartas-feiras, exibem filmes nacionais e estrangeiros. Não cobram um ingresso, porque a expectativa é de que as pessoas consumam algo. Assim, se lhe falta dinheiro, é possível pedir um refrigerante (que mesmo sendo caro aqui na Argentina, cabe no bolso) e assistir ao filme feliz.

Sobre "Carancho": não seria honesto se dissesse que o filme em questão me encantou, mas de todas maneiras tem seus méritos, pois consegue manter a atenção do espectador durante mais de uma hora em um clima de leve suspense. O filme conta a história de um advogado - Sosa - que participa de um grupo mafioso que provoca acidentes de trânsito para que pessoas acionem suas companhias de seguros. Esse advogado é o "carancho" a que o título faz referência e, segundo pude apurar, o carancho é uma ave de rapina. Está explicada (e morta) a analogia.

Após provocar mais um acidente, Sosa conhece Luján, médica que trabalha no serviço de ambulâncias. Os dois começam um relacionamento com muitos desencontros motivados pela profissão nada convencional dele. Ou, de acordo com uma crítica: "Juntos, intentarán modificar el rumbo de sus vidas, pero el pasado turbulento de Sosa se interpondrá."

É um filme interessante porque, segundo me disseram, esse tipo de ocorrência é bastante comum na Argentina e, por esse ângulo, é válido que se faça uma denúncia. O problema é que, para o meu gosto particular, corre muito sangue ao longo da exibição e existem cenas desnecessárias, como uma em que o personagem principal literalmente quebra o joelho de um de seus "clientes" com uma marreta. Mas, como há gosto para tudo, talvez alguém tenha interesse em conferir.

Crédito da imagem: http://www.filmaffinity.com/es/film918617.html

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

"Mas há a vida que é para ser intensamente vivida..."

A frase que coloquei por título pertence a uma das crônicas de Clarice Lispector, publicada no livro "A descoberta do mundo". Vem ao caso porque, depois da postagem anterior pode parecer que eu fiquei muito triste no dia do meu aniversário e deixar que isso se confirme é permitir que se confirme uma mentira e omitir o carinho e a consideração dos amigos que tenho feito aqui entre hermanos, alemães e mexicanos! Abaixo coloco fotos da "festinha" que fizeram para mim ontem à noite.

[PÓS-ESCRITO][30/09/2015]

Houve fotos aqui um dia. Perderam-se sei lá por que. Quem frequenta minha casa (falo de 'real life') talvez já tenha visto o álbum da viagem e as fotos da festa. Os amigos virtuais pode ser que encontrem alguma coisa no Facebook.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Cumplir años...

Sinto um certo deslocamento por "cumplir años" longe de casa. No Brasil, o dia de hoje seria feriado e, em certa medida, isso torna tudo mais fácil (porque mais previsível). Depois de deitar tarde na véspera, me permitiria estar na cama mais tempo e, ao levantar, ajudaria na preparação do almoço e esperaria os familiares e alguns amigos mais próximos para comermos juntos. À noite poderia ir a uma pizzaria e depois voltaria à rotina.

Mas aqui, não é feriado. Ao contrário da calmaria, eu tenho aulas durante quase todo o dia e nem sequer tenho idéia de como comemorar. Um almoço? Umas pizzas com os amigos?

Cantoras brasileiras: autenticidade e carreira internacional

Faz pouco mais de dez minutos que vi no site do Yahoo uma notícia sobre uma crítica do prestigioso "The New York Times", na qual se avalia como sendo pequenas as chances de Ivete Sangalo decolar em uma carreira internacional, porque seu repertório está composto basicamente por músicas em português.

Para mim, há várias questoes envolvidas nesse caso e que seria interessante refletir sobre elas. Vou elencar apenas duas:

1. Se cantasse em inglês ou em espanhol, Ivete conseguiria "levar o carnaval brasileiro" à Nova Iorque? Cobram dela que cante em outras línguas, como Shakira, mas se ela o fizesse, os mesmos críticos que agora prognosticam "suas limitadas chances de carreira internacional" por uma questao "lingüística"; os mesmos críticos iriam limitar-lhe por uma falta de "autenticidade", seja lá o que for que possam querer dizer com isso.

2. Que imagem os americanos (e, acrescento, os europeus) têm do Brasil? Esperam ainda hoje que vá se apresentar Carmen Miranda, com um turbante cheio de frutas na cabeça? Carmen, por causa da imagem que construiu, podia cantar na língua que quisesse, porque seu visual "garantia que era brasileira".

As cantoras brasileiras precisam fazer sua arte, da maneira como a entendem, sem preocupar-se com os critérios da crítica.

Neste sentido, me encanta o vídeo de Maysa quando se apresenta no Japao e diz (vai sem aspas porque cito de memória e faço intervençoes...): vocês esperam que eu vá cantar samba (uma coisa alegre), mas o samba que eu canto é de um tipo diferente, se chama samba cançao. E interpreta um dos clássicos da "dor de cotovelo" ou "música de fossa", como queiram: "Meu mundo caiu".


E, por via das dúvidas, ponho o vídeo abaixo:

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Perplexidade em mão dupla

Chegar na Argentina para estudar a língua castelhana e a literatura latino-americana é, de algum modo, expor-me à sabatina de nossos "hermanos". Responder às perguntas que me fazem, às vezes, permite fazer algumas descobertas interessantes.

Uma delas tem que ver com o autor José Mauro de Vasconcelos e seu livro (quiçá) mais conhecido "Meu pé de laranja lima". Aqui na Argentina, esse autor segue popular e muitos jovens que estão aí com seus 18 anos (ou um pouco mais, 21, 22 anos...) leram "Mi planta de naranja-lima" (capa ao lado) em sua fase de alfabetização.

Quando digo que no Brasil já não se trata de um autor muito comentado em âmbito escolar (pelo menos não na região em que vivo) ocorre uma perplexidade em mão dupla. Tanto eu me surpreendo que este autor seja lido aqui (pois não chegou a fazer parte da minha formação) quanto os argentinos se surpreendem que o autor não seja lido no Brasil. É um pouco estranho, mas acontece.





Crédito da imagem: http://www.elresumen.com/libros/mi_planta_de_naranja_lima.htm

Ler literatura...

Escrevo este texto em atenção ao comentário que recebi da Helena em relação ao último post deste blog. Ela declara que "Gostaria de entender essa fascinação que tantos brasileiros têem por Clarice. No contexto de adoração que muitos constroem ao redor de seus escritos, fico até com medo de falar o que realmente penso sem antes estar calcada em forte base argumentativa."

A questão, pelo menos desde onde a vejo, tem muito que ver com modismo e publicidade. Clarice, lamentavelmente, está na moda. E com isso quero dizer que muita gente lê seus livros e os comenta sem estar calcado nessa "forte base argumentativa". Lê porque o livro aparece na novela das oito.

A própria Clarice muitas vezes declarou que seus textos não podiam ser compreendidos a partir de uma mirada intelectual. Gostar deles, para ela, era uma questão de toque. Ou seja, de sentir-se tocado pelo texto.

Daí que, partindo de uma premissa estética, isto é, encarando a leitura de textos literários como uma atividade de fruição estética, de toque, é muito pertinente não ler Clarice se os textos dela não lhe tocam de alguma maneira. Por isso, como diz Helena, "Já de outras autoras e autores brasileiros que não estão na moda, como você mesmo disse, li textos que me deixaram com esta sensação, ou seja, por algum tempo no ar."

Por isso, destaco, por exemplo, um poema de Cecília Meireles que simplesmente me encanta e que não forma parte do corpus estudado nas escolas, onde todos acreditam que a autora só escreveu os poemas de "Ou isto ou aquilo":

Humildade

Tanto que fazer !
Livros que não se lêem, cartas que não se escrevem,
línguas que não se aprendem,
amor que não se dá,
tudo quanto se esquece.

Amigos entre adeuses,
crianças chorando na tempestade,
cidadãos assinando papéis, papéis, papéis...
até o fim do mundo assinando papéis.

E os pássaros detrás de grades de chuvas,
e os mortos em redôma de cânfora.

(E uma canção tão bela!)

Tanto que fazer!
E fizemos apenas isto.
E nunca soubemos quem éramos,
nem para quê.


Para finalizar: que cada um leia e considere "boa literatura" aquilo que mais lhe apraz e que se permita percorrer as estantes de bibliotecas e livrarias com um olhar atento e sempre disposto a encontrar alguma surpresa. Helena, muito obrigado pelo comentário. Um abraço.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

"Finde largo": ao largo...

No sábado 17/08 foi comemorado aqui na Argentina o dia de San Martín, um dos próceres da pátria, falecido há 160 anos.

Imaginamos - eu, Andrej (alemão) e Luiz (mexicano), ambos vivem no mesmo alojamento que eu aqui na universidade - que seria uma excelente oportunidade de conhecer alguma outra cidade argentina e estávamos por decidir entre Córdoba e Rosário. Eram duas opções igualmente tentadoras, visto tratar-se das duas grandes cidades argentinas que disputam o prestigioso segundo lugar em termos de desenvolvimento depois de Buenos Aires. E, por isso mesmo, custamos a nos decidir.

À última hora, já no terminal de ônibus de Villa María, é que batemos o martelo: Rosário, situada na província de Santa Fé.

A viagem desde Villa María dura mais ou menos quatro horas em um ônibus parador (é, isso também existe por aqui...). Mas, como todo plano de última hora, ela nos brindou com situações que oscilam do trágico ao cômico.

Trágico: por ser fim de semana largo (que é como aqui chamam os "feriadões") e porque não tínhamos reserva, ficamos sem hospedagem. Depois de percorrer vários hotéis e gastar uma quantidade razoável de dinheiro em traslados de táxi, decidimos que o mais seguro seria dormir no terminal de ônibus.

Cômico: como a necessidade faz o homem (e a mulher também, porque agregamos uma holandesa à trupe), ficamos no terminal de ônibus até a manhã de domingo e, para não ficarmos expostos, entrávamos em ciber cafés, bares e outros estabelecimentos comerciais e neles ficávamos até que delicadamente os donos fossem fechando as portas para que nós saíssemos.

Trágico (2): no domingo tentamos embarcar para um passeio no rio Paraná com duração de duas horas. O preço era baixo ($ 23 vinte e três pesos; aprox. R$ 12,50) e as pessoas afluíram. Acabaram os ingressos enquanto estávamos na fila e depois dessa decidimos voltar para Villa María.

O que ficou de tudo isso: uns "souvenires" comprados no chamado Mercado de Pulgas del Bajo, que é uma feira de artesanato às margens do rio Paraná e muitas fotos do Monumento à Bandeira Argentina... uma construção espetacular, que ilustra o quanto esse povo é nacionalista e o quanto é distinta uma história que se construiu com lutas explicitamente reconhecidas. Porque é forçoso reconhecer que a Independência e a Bandeira e os Hinos do Brasil foram muito comodamente construídos e transmitidos de cima para baixo...

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Saias justas linguísticas

Como bom brasileiro, chego aos lugares tentando entabular conversação com as pessoas. Em português brasileiro poderíamos dizer que chego querendo "bater papo"; mas por aqui a prosa tem de começar de outro jeito. É que "papo", na Argentina, é o nome vulgar para a vagina... O mesmo acontece quando alguém pede que prepare uma "caipiroca" e, delicadamente, preciso indicar que o mais adequado é dizer caipirinha mesmo.

Comidas

Comer na Argentina pode resultar um pouco difícil para os brasileiros acostumados a degustar arroz com feijão todos os dias. Isto porque a base da alimentação do pessoal aqui é a carne (bovina), presente em pratos típicos como os lomitos, as milanesas e os asados (aqui escrevem com um "s" só) que são as opções mais facilmente encontradas nos cardápios. O acompanhamento que vi mais vezes foi batatas fritas (ou purê de batatas) e salada (isto é: alface, cenoura ralada e tomate)

Também é comum que coloquem um ou dois pãezinhos de sal junto com o prato. Agora, há que dizer que os restaurantes e cafés não cobram muito barato pela refeição. Ainda assim, os maus cozinheiros comem (ver foto).

Minha dica é buscar aqueles que ofereçam um "menú del día", que normalmente inclui um copo de "gaseosa" (Aquarius Fresh ou H2OH...) e a sobremesa. Vão te cobrar $ 15,00 (quinze pesos; aproximadamente R$ 7,50) por essa refeição.

Outra coisa: os refrigerantes aqui custam muito caro... há que certificar-se muito bem antes de pedir um porque podem te cobrar $ 8,00 (oito pesos; aproximadamente R$ 4,00) por uma Coca-Cola de 500ml.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Reativado para a crítica

Enquanto estava no Brasil, muitas vezes me perdia entre manter um trabalho e estudar, mas, agora que estou no estrangeiro só por conta de estudos, tenho um pouco mais de tempo para ler e escrever, de modos que pretendo reativar este blog. Hoje o reativo para fazer uma crítica, já que o site do Terra Notícias não deixa espaço a comentários. Ou eu não sei fazer comentários. Dá na mesma.

O que se passa é que estava procurando notícias sobre a escritora Clarice Lispector, que também vou estudar aqui na Argentina, e topei com a seguinte página http://diversao.terra.com.br/arteecultura/noticias/0,,OI4612287-EI3615,00-Biografo+americano+considera+Clarice+Lispector+acima+da+media.html.

E escrevo a postagem para fazer um reparo, e só um: não é possível ler impunemente uma afirmação do tipo: "Clarice Lispector vive para Benjamin Moser. O norte-americano nascido em Houston é o maior biógrafo da escritora brasileira mais famosa." A minha, digamos, indignação se deve a que:

1. Benjamim Moser escreveu um ensaio biográfico sobre Clarice e que as editoras estão vendendo como sendo o melhor trabalho sobre a autora. Endossar esse tipo de discurso, porém, implica em ocultar nomes importantíssimos nos estudos clariceanos como Olga Borelli e Nádia Battella Gotlib, para citar apenas dois.

2. Apesar de Clarice ser uma grande escritora (eu próprio sou um amante de sua prosa) e de atualmente estar sendo destacada porque a leitura de seus livros confere status aos leitores; dizer que seja a escritora brasileira mais famosa é ignorar dois fatos:

a) em vida, Clarice encontrou mais incompreensão que uma admiração sincera por parte da crítica, que muitas vezes a tachou de hermética e difícil; levando-a a surpreender-se com a recepção que teve sua coluna semanal no hoje extinto JB, nos idos de 1967.

b) existem outras escritoras "de peso" na literatura brasileira, como Cecília Meireles, Lígia Fagundes Telles, Rachel de Queiroz, Carolina Maria de Jesus, Dinah Silveira de Queiroz e muitas outras que, se não são estudadas e badaladas pela mídia, é devido ao fato de não existir um interesse editorial de que isso ocorra e também porque elas "já saíram de moda", o que me parece muito triste e cruel. Sobretudo no caso de Lígia, que enfrenta uma morte em vida.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Na casa do "Che": aventuras de uma trupe meio estranha em Alta Gracia

Quinta-feira. 9h. Me demoro à mesa do café do hostel ainda vazio.

"Você tem algum plano para hoje?". Perguntou, num espanhol sofrível, um alemão (Sebastian) que havia chegado na noite anterior - certamente quando eu já dormia.  "Não". Respondi laconicamente. Minha programação era ficar dentro do hostel até as 11h, esperando a temperatura subir um pouco para só então sair.

"Se quiser, pode vir conosco." A referência no plural é porque ele estava acompanhado por um russo (Serguei). "Tudo bem", respondi, mesmo sabendo que isso me deixava na obrigação de mover-me um pouco mais cedo. De qualquer maneira, eu achava que a experiência valia a pena.

Depois de mais alguns minutos, tive de responder à mesma pergunta, mas agora vinda da parte de dois outros brasileiros que estavam por ali. Eram mochileiros - Alexandre e Vinícius. E quando me dei conta, tanto uns como os outros queriam visitar Alta Gracia para ver a casa onde Che Guevara passou parte da infância dele.

A contragosto terminei o desjejum e troquei de roupa. E lá fomos nós cinco, falando em espanhol e inglês (eu muito pouco) a ver se lográvamos algum êxito comunicativo.

Apesar dessas peripécias idiomáticas, os mochileiros e eu nos apresentamos como franceses na tenda de informações ao turista.

Alta Gracia fica a 39 Km ao sudoeste da cidade de Córdoba. Para chegar até lá, pode-se tomar um ônibus no terminal rodoviário, ao preço de $ 7,00 (sete pesos, aproximadamente R$ 3,50). Há duas empresas que fazem esse trajeto: LED e Sarmiento. A cidade constitui um pólo turístico de interesse por conta de três atrações: as Estâncias Jesuíticas, o Museo Ernesto Che Guevara e o Museo Manuel de Falla.

O Museo Ernesto Che Guevara é uma construção de estilo inglês onde "Che" viveu parte de sua infância em função de ter asma. Na época, recomendava-se o clima de Alta Gracia, mais seco, para tratamento de doenças respiratórias. Cobra-se uma entrada de $ 5,00 (cinco pesos, aproximadamente R$ 2,50).

Nesta residência, chamada Villa Nydia, estão expostos objetos que foram usados pelo guerrilheiro, os livros que manuseou quando pequeno (Júlio Verne, Emilio Salgari, Jack London) e reproduções de artigos que ele escreveu sobre as viagens que fez pelos países da América Latina e sobre a Revolução Cubana. Destaca-se também uma sala destinada ao registro da visita que Hugo Chávez e Fidel Castro fizeram ao local em 2006. Ali está exposta a assinatura dos dois "presidentes" e é curioso ler o que Chávez deixou assinado: "Hasta la victoria, siempre."

Depois de visitar o Museu voltamos ao centro da cidade. Estávamos com fome, mas, por distração, estendemos o turismo além das 13h, fato que fez nosso retorno coincidir com o horário da "siesta". O único local com sinal de vida era um "kiosco" onde um senhor nos ofereceu uns sanduíches de queijo com presunto que, presumíamos, eram mais velhos que o próprio senhor que os oferecia. Por amor à vida, dispensamos.

Tentamos depois pegar umas frutas que pareciam laranjas. As ruas estavam com várias árvores carregadas. Mas, como dizem no Brasil, pegar fruta madura que está dando mole na beira da estrada é "roubada". Não que houvesse marimbondo no pé, mas as frutas eram muito azedas...

Só fomos comer depois de voltar a Córdoba. Passava das 17h.

Adaptando-me (2): Língua

A maior dificuldade é que as pessoas costumam falar muito rápido por aqui. Ademais do fenômeno do voseo, que é muito característico. De todas maneiras, se vêem que você é estrangeiro pode ocorrer que falem "más despacito"... E há também coisas que denunciam que sou brasileiro e ajudam nessa "sensibilização". Até agora descobri duas:

1. Por aqui sempre dizem UNA ou UNO MÁS, enquanto que no Brasil dizemos MAIS UM ou MAIS UMA.

2. Por aqui sempre respondem com SÍ ou NO, porém sem repetir o verbo como costumamos fazer no Brasil. Assim, se te perguntam: tem aula agora? A resposta deve ser SÍ (sim), em vez de SÍ, TENGO (sim, tenho).

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Adaptando-me: Clima

A minha primeira dificuldade aqui, além do idioma, foi o clima. Quando o avião pousou, anunciaram cinco graus e apenas começavam os problemas... nesses últimos dias tem amanhecido com uma média de 2º ou 3º.

Por isso, espero sempre que dê umas dez ou onze da manhã para tentar me arriscar a sair do hostel. Ao longo do dia, o que mais incomoda são os ventos, motivo pelo qual tive de adaptar-me logo ao uso de muitos agasalhos (ver foto).

Não é exagero dizer que a gente anda com roupas até a cabeça...

Depois do museu... a Manzana Jesuítica!

Depois de sair do Palacio Ferreyra, o rapaz da Alemanha (Christian) me perguntou se eu tinha algo para fazer. Como estava sem planos fixos, o acompanhei até a chamada Manzana Jesuítica, no centro de Córdoba.

Pagamos os $ 10.00 (dez pesos; aproximadamente cinco reais) para visita guiada e esperamos uns dez minutos para que juntasse mais gente. Além de explicações sobre a arquitetura dos edifícios, durante essa visita tem-se acesso às dependências onde a Universidad Nacional de Córdoba (UNC) - responsável pelo espaço - guarda livros e mapas que formavam parte da biblioteca dos frades. Alguns dos mapas estão expostos e é uma experiência interessante contrastar as maneiras como o continente americano vem sendo visto ao longo dos séculos. Também pudemos visitar o salão nobre onde os doutorandos fazem a defesa de sua tese.



Crédito da imagem: http://www.argentinavirtual.educ.ar/localhost/index5799.html?option=com_content&view=article&id=1349:manzana-jesuitica-cordoba&catid=38:recorridos-navegador.

Museo Superior de Bellas Artes Eva Perón (ou Palacio Ferreyra)

O Palacio Ferreyra situa-se próximo ao terminal rodoviário de Córdoba e pode ser acessado facilmente por alguém que chegue à cidade de ônibus. O hostel onde estou fica próximo do local e na tarde de ontem (quarta-feira) eu decidi conhecer o Museu, que já me havia sido recomendado pela professora que me recebeu aqui na Argentina. À entrada, me encontrei com um alemão que estuda no Chile e passava férias aqui na Argentina. Acabamos visitando o acervo juntos, enquanto tratávamos de comentar as obras em um espanhol bastante razoável.

Vimos quadros e esculturas de variados artistas que constituem um corpus da arte cordobesa ao longo dos séculos XIX e XX. O prédio conta com três andares (ou níveis) com exposições. Recomenda-se iniciar a visita pelo Nível 1, da esquerda para direita e em seguida os Níveis 2 e 3 (também da esquerda para direita). Por último o subsolo (ou Nível 0, como o chamam) onde situam-se exposições de artistas contemporâneos. Na ocasião, expunham-se os trabalhos da artista plástica Cristina Santander - a mostra intitula-se Avis Rara - e contempla trabalhos com múltiplas técnicas e materiais.

Me chamaram a atenção as pinturas inseridas em acrílico. Infelizmente, não permitem tirar fotos do interior do museu. Uma curiosidade: nessa mostra havia duas esculturas intituladas "Menina Blanca" e "Menina Azul". O alemão não sabia o que é menina (a palavra em espanhol é "chica" e em alemão não faço nem idéia) e eu tive de explicar a ele o que aquilo queria dizer.

Pelo visto, não sou o único com dificuldades linguisticas e Velázquez não foi o único a buscar no português um nome para seus trabalhos.

Crédito da imagem: http://www.cba.gov.ar/cordoba-cultura/museo-superior-de-bellas-artes-evita-palacio-ferreyra/

terça-feira, 22 de junho de 2010

Um blog inativo

Era uma vez um blog,
um blog inativo.

Não era assim de sua própria vontade,
aconteceu que foi trocado por outras
prioridades.

Não suas, que não as tem,
mas de seu desvairado autor,
que atreveu-se a tratar a escrita com desdém.

Não um desdém plenipotente. Não.
É um desdém de outro tipo, de outro jeito.
Desdém do macaco que chama de podre
a fruta que não alcança.

O autor não sabe escrever,
nem se manter num mesmo ritmo de trabalho.

E o blog dança!

domingo, 31 de janeiro de 2010

Quixotadas

Entre este janeiro que hoje termina e o março em que as chuvas encerram o verão, eu preciso tomar cuidar para não ter uma overdose de Dom Quixote.

Hoje à tarde, estive conferindo Dom Chicote Mula Manca, montagem da Isto Cia. Teatral do texto de Oscar Von Pfuhl. Excelente adaptação a do autor, que prioriza o aspecto "justiceiro" do herói e, de quebra, faz refletir sobre as espertezas dos governantes. Excelente também a atuação dos atores, que já tive o cuidado de elogiar num e-mail à parte.

Agora em fevereiro, tenho um encontro marcado com o herói da Mancha no dia 20, quando o grupo de leituras de que participo (o Palimpsestos) discutirá a obra de Cervantes. Antes um pouco, no domingo de Carnaval, vou gastar um tempinho na frente da TV para conferir o desfile da União da Ilha, cuja permanência no Grupo Especial dos festejos cariocas, é tão ilusória quanto os gigantes que são moinhos. Ou são moinhos que são gigantes?

Por fim, em março, temos o segundo tempo das discussões palimpsestícas. Agora é ver se eu tenho pique para tudo isso e mais um pouco, né? Porque passados os festejos de Momo, a vida tem de começar a andar neste Brasil!!!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

O Haiti é aqui?

Um comentário que tenho ouvido com relativa freqüência a respeito da ajuda brasileira ao Haiti: "o governo tem que ajudar os brasileiros, tem nordestino morrendo de sede e eles querem aparecer ajudando lá fora." Discordo.

Tudo bem que nós temos, sim, nossos problemas e nossos muitos Haitis, como proclamava outro dia um irritado Datena na TV Bandeirantes, mas isso não nos exime do dever HUMANO de exercer a solidariedade também com esse povo haitiano que tanto tem sofrido com esses acontecimentos.

PS: a cobertura excessiva da mídia, apesar de nos manter "informados", não traz nenhuma vantagem à população que eles filmam comendo restos e correndo entre ruas devastadas e mortos insepultos.