sexta-feira, 27 de agosto de 2010

"Finde largo": ao largo...

No sábado 17/08 foi comemorado aqui na Argentina o dia de San Martín, um dos próceres da pátria, falecido há 160 anos.

Imaginamos - eu, Andrej (alemão) e Luiz (mexicano), ambos vivem no mesmo alojamento que eu aqui na universidade - que seria uma excelente oportunidade de conhecer alguma outra cidade argentina e estávamos por decidir entre Córdoba e Rosário. Eram duas opções igualmente tentadoras, visto tratar-se das duas grandes cidades argentinas que disputam o prestigioso segundo lugar em termos de desenvolvimento depois de Buenos Aires. E, por isso mesmo, custamos a nos decidir.

À última hora, já no terminal de ônibus de Villa María, é que batemos o martelo: Rosário, situada na província de Santa Fé.

A viagem desde Villa María dura mais ou menos quatro horas em um ônibus parador (é, isso também existe por aqui...). Mas, como todo plano de última hora, ela nos brindou com situações que oscilam do trágico ao cômico.

Trágico: por ser fim de semana largo (que é como aqui chamam os "feriadões") e porque não tínhamos reserva, ficamos sem hospedagem. Depois de percorrer vários hotéis e gastar uma quantidade razoável de dinheiro em traslados de táxi, decidimos que o mais seguro seria dormir no terminal de ônibus.

Cômico: como a necessidade faz o homem (e a mulher também, porque agregamos uma holandesa à trupe), ficamos no terminal de ônibus até a manhã de domingo e, para não ficarmos expostos, entrávamos em ciber cafés, bares e outros estabelecimentos comerciais e neles ficávamos até que delicadamente os donos fossem fechando as portas para que nós saíssemos.

Trágico (2): no domingo tentamos embarcar para um passeio no rio Paraná com duração de duas horas. O preço era baixo ($ 23 vinte e três pesos; aprox. R$ 12,50) e as pessoas afluíram. Acabaram os ingressos enquanto estávamos na fila e depois dessa decidimos voltar para Villa María.

O que ficou de tudo isso: uns "souvenires" comprados no chamado Mercado de Pulgas del Bajo, que é uma feira de artesanato às margens do rio Paraná e muitas fotos do Monumento à Bandeira Argentina... uma construção espetacular, que ilustra o quanto esse povo é nacionalista e o quanto é distinta uma história que se construiu com lutas explicitamente reconhecidas. Porque é forçoso reconhecer que a Independência e a Bandeira e os Hinos do Brasil foram muito comodamente construídos e transmitidos de cima para baixo...

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Saias justas linguísticas

Como bom brasileiro, chego aos lugares tentando entabular conversação com as pessoas. Em português brasileiro poderíamos dizer que chego querendo "bater papo"; mas por aqui a prosa tem de começar de outro jeito. É que "papo", na Argentina, é o nome vulgar para a vagina... O mesmo acontece quando alguém pede que prepare uma "caipiroca" e, delicadamente, preciso indicar que o mais adequado é dizer caipirinha mesmo.

Comidas

Comer na Argentina pode resultar um pouco difícil para os brasileiros acostumados a degustar arroz com feijão todos os dias. Isto porque a base da alimentação do pessoal aqui é a carne (bovina), presente em pratos típicos como os lomitos, as milanesas e os asados (aqui escrevem com um "s" só) que são as opções mais facilmente encontradas nos cardápios. O acompanhamento que vi mais vezes foi batatas fritas (ou purê de batatas) e salada (isto é: alface, cenoura ralada e tomate)

Também é comum que coloquem um ou dois pãezinhos de sal junto com o prato. Agora, há que dizer que os restaurantes e cafés não cobram muito barato pela refeição. Ainda assim, os maus cozinheiros comem (ver foto).

Minha dica é buscar aqueles que ofereçam um "menú del día", que normalmente inclui um copo de "gaseosa" (Aquarius Fresh ou H2OH...) e a sobremesa. Vão te cobrar $ 15,00 (quinze pesos; aproximadamente R$ 7,50) por essa refeição.

Outra coisa: os refrigerantes aqui custam muito caro... há que certificar-se muito bem antes de pedir um porque podem te cobrar $ 8,00 (oito pesos; aproximadamente R$ 4,00) por uma Coca-Cola de 500ml.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Reativado para a crítica

Enquanto estava no Brasil, muitas vezes me perdia entre manter um trabalho e estudar, mas, agora que estou no estrangeiro só por conta de estudos, tenho um pouco mais de tempo para ler e escrever, de modos que pretendo reativar este blog. Hoje o reativo para fazer uma crítica, já que o site do Terra Notícias não deixa espaço a comentários. Ou eu não sei fazer comentários. Dá na mesma.

O que se passa é que estava procurando notícias sobre a escritora Clarice Lispector, que também vou estudar aqui na Argentina, e topei com a seguinte página http://diversao.terra.com.br/arteecultura/noticias/0,,OI4612287-EI3615,00-Biografo+americano+considera+Clarice+Lispector+acima+da+media.html.

E escrevo a postagem para fazer um reparo, e só um: não é possível ler impunemente uma afirmação do tipo: "Clarice Lispector vive para Benjamin Moser. O norte-americano nascido em Houston é o maior biógrafo da escritora brasileira mais famosa." A minha, digamos, indignação se deve a que:

1. Benjamim Moser escreveu um ensaio biográfico sobre Clarice e que as editoras estão vendendo como sendo o melhor trabalho sobre a autora. Endossar esse tipo de discurso, porém, implica em ocultar nomes importantíssimos nos estudos clariceanos como Olga Borelli e Nádia Battella Gotlib, para citar apenas dois.

2. Apesar de Clarice ser uma grande escritora (eu próprio sou um amante de sua prosa) e de atualmente estar sendo destacada porque a leitura de seus livros confere status aos leitores; dizer que seja a escritora brasileira mais famosa é ignorar dois fatos:

a) em vida, Clarice encontrou mais incompreensão que uma admiração sincera por parte da crítica, que muitas vezes a tachou de hermética e difícil; levando-a a surpreender-se com a recepção que teve sua coluna semanal no hoje extinto JB, nos idos de 1967.

b) existem outras escritoras "de peso" na literatura brasileira, como Cecília Meireles, Lígia Fagundes Telles, Rachel de Queiroz, Carolina Maria de Jesus, Dinah Silveira de Queiroz e muitas outras que, se não são estudadas e badaladas pela mídia, é devido ao fato de não existir um interesse editorial de que isso ocorra e também porque elas "já saíram de moda", o que me parece muito triste e cruel. Sobretudo no caso de Lígia, que enfrenta uma morte em vida.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Na casa do "Che": aventuras de uma trupe meio estranha em Alta Gracia

Quinta-feira. 9h. Me demoro à mesa do café do hostel ainda vazio.

"Você tem algum plano para hoje?". Perguntou, num espanhol sofrível, um alemão (Sebastian) que havia chegado na noite anterior - certamente quando eu já dormia.  "Não". Respondi laconicamente. Minha programação era ficar dentro do hostel até as 11h, esperando a temperatura subir um pouco para só então sair.

"Se quiser, pode vir conosco." A referência no plural é porque ele estava acompanhado por um russo (Serguei). "Tudo bem", respondi, mesmo sabendo que isso me deixava na obrigação de mover-me um pouco mais cedo. De qualquer maneira, eu achava que a experiência valia a pena.

Depois de mais alguns minutos, tive de responder à mesma pergunta, mas agora vinda da parte de dois outros brasileiros que estavam por ali. Eram mochileiros - Alexandre e Vinícius. E quando me dei conta, tanto uns como os outros queriam visitar Alta Gracia para ver a casa onde Che Guevara passou parte da infância dele.

A contragosto terminei o desjejum e troquei de roupa. E lá fomos nós cinco, falando em espanhol e inglês (eu muito pouco) a ver se lográvamos algum êxito comunicativo.

Apesar dessas peripécias idiomáticas, os mochileiros e eu nos apresentamos como franceses na tenda de informações ao turista.

Alta Gracia fica a 39 Km ao sudoeste da cidade de Córdoba. Para chegar até lá, pode-se tomar um ônibus no terminal rodoviário, ao preço de $ 7,00 (sete pesos, aproximadamente R$ 3,50). Há duas empresas que fazem esse trajeto: LED e Sarmiento. A cidade constitui um pólo turístico de interesse por conta de três atrações: as Estâncias Jesuíticas, o Museo Ernesto Che Guevara e o Museo Manuel de Falla.

O Museo Ernesto Che Guevara é uma construção de estilo inglês onde "Che" viveu parte de sua infância em função de ter asma. Na época, recomendava-se o clima de Alta Gracia, mais seco, para tratamento de doenças respiratórias. Cobra-se uma entrada de $ 5,00 (cinco pesos, aproximadamente R$ 2,50).

Nesta residência, chamada Villa Nydia, estão expostos objetos que foram usados pelo guerrilheiro, os livros que manuseou quando pequeno (Júlio Verne, Emilio Salgari, Jack London) e reproduções de artigos que ele escreveu sobre as viagens que fez pelos países da América Latina e sobre a Revolução Cubana. Destaca-se também uma sala destinada ao registro da visita que Hugo Chávez e Fidel Castro fizeram ao local em 2006. Ali está exposta a assinatura dos dois "presidentes" e é curioso ler o que Chávez deixou assinado: "Hasta la victoria, siempre."

Depois de visitar o Museu voltamos ao centro da cidade. Estávamos com fome, mas, por distração, estendemos o turismo além das 13h, fato que fez nosso retorno coincidir com o horário da "siesta". O único local com sinal de vida era um "kiosco" onde um senhor nos ofereceu uns sanduíches de queijo com presunto que, presumíamos, eram mais velhos que o próprio senhor que os oferecia. Por amor à vida, dispensamos.

Tentamos depois pegar umas frutas que pareciam laranjas. As ruas estavam com várias árvores carregadas. Mas, como dizem no Brasil, pegar fruta madura que está dando mole na beira da estrada é "roubada". Não que houvesse marimbondo no pé, mas as frutas eram muito azedas...

Só fomos comer depois de voltar a Córdoba. Passava das 17h.

Adaptando-me (2): Língua

A maior dificuldade é que as pessoas costumam falar muito rápido por aqui. Ademais do fenômeno do voseo, que é muito característico. De todas maneiras, se vêem que você é estrangeiro pode ocorrer que falem "más despacito"... E há também coisas que denunciam que sou brasileiro e ajudam nessa "sensibilização". Até agora descobri duas:

1. Por aqui sempre dizem UNA ou UNO MÁS, enquanto que no Brasil dizemos MAIS UM ou MAIS UMA.

2. Por aqui sempre respondem com SÍ ou NO, porém sem repetir o verbo como costumamos fazer no Brasil. Assim, se te perguntam: tem aula agora? A resposta deve ser SÍ (sim), em vez de SÍ, TENGO (sim, tenho).

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Adaptando-me: Clima

A minha primeira dificuldade aqui, além do idioma, foi o clima. Quando o avião pousou, anunciaram cinco graus e apenas começavam os problemas... nesses últimos dias tem amanhecido com uma média de 2º ou 3º.

Por isso, espero sempre que dê umas dez ou onze da manhã para tentar me arriscar a sair do hostel. Ao longo do dia, o que mais incomoda são os ventos, motivo pelo qual tive de adaptar-me logo ao uso de muitos agasalhos (ver foto).

Não é exagero dizer que a gente anda com roupas até a cabeça...

Depois do museu... a Manzana Jesuítica!

Depois de sair do Palacio Ferreyra, o rapaz da Alemanha (Christian) me perguntou se eu tinha algo para fazer. Como estava sem planos fixos, o acompanhei até a chamada Manzana Jesuítica, no centro de Córdoba.

Pagamos os $ 10.00 (dez pesos; aproximadamente cinco reais) para visita guiada e esperamos uns dez minutos para que juntasse mais gente. Além de explicações sobre a arquitetura dos edifícios, durante essa visita tem-se acesso às dependências onde a Universidad Nacional de Córdoba (UNC) - responsável pelo espaço - guarda livros e mapas que formavam parte da biblioteca dos frades. Alguns dos mapas estão expostos e é uma experiência interessante contrastar as maneiras como o continente americano vem sendo visto ao longo dos séculos. Também pudemos visitar o salão nobre onde os doutorandos fazem a defesa de sua tese.



Crédito da imagem: http://www.argentinavirtual.educ.ar/localhost/index5799.html?option=com_content&view=article&id=1349:manzana-jesuitica-cordoba&catid=38:recorridos-navegador.

Museo Superior de Bellas Artes Eva Perón (ou Palacio Ferreyra)

O Palacio Ferreyra situa-se próximo ao terminal rodoviário de Córdoba e pode ser acessado facilmente por alguém que chegue à cidade de ônibus. O hostel onde estou fica próximo do local e na tarde de ontem (quarta-feira) eu decidi conhecer o Museu, que já me havia sido recomendado pela professora que me recebeu aqui na Argentina. À entrada, me encontrei com um alemão que estuda no Chile e passava férias aqui na Argentina. Acabamos visitando o acervo juntos, enquanto tratávamos de comentar as obras em um espanhol bastante razoável.

Vimos quadros e esculturas de variados artistas que constituem um corpus da arte cordobesa ao longo dos séculos XIX e XX. O prédio conta com três andares (ou níveis) com exposições. Recomenda-se iniciar a visita pelo Nível 1, da esquerda para direita e em seguida os Níveis 2 e 3 (também da esquerda para direita). Por último o subsolo (ou Nível 0, como o chamam) onde situam-se exposições de artistas contemporâneos. Na ocasião, expunham-se os trabalhos da artista plástica Cristina Santander - a mostra intitula-se Avis Rara - e contempla trabalhos com múltiplas técnicas e materiais.

Me chamaram a atenção as pinturas inseridas em acrílico. Infelizmente, não permitem tirar fotos do interior do museu. Uma curiosidade: nessa mostra havia duas esculturas intituladas "Menina Blanca" e "Menina Azul". O alemão não sabia o que é menina (a palavra em espanhol é "chica" e em alemão não faço nem idéia) e eu tive de explicar a ele o que aquilo queria dizer.

Pelo visto, não sou o único com dificuldades linguisticas e Velázquez não foi o único a buscar no português um nome para seus trabalhos.

Crédito da imagem: http://www.cba.gov.ar/cordoba-cultura/museo-superior-de-bellas-artes-evita-palacio-ferreyra/