sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Lobato e o racismo no Brasil

Comento com algum atraso a polêmica que envolve o livro "Caçadas de Pedrinho" (capa ao lado), do escritor paulista Monteiro Lobato. Desde o final de outubro, o Conselho Nacional de Educação (CNE) proibiu a circulação do livro em escolas sob a alegação de que seu conteúdo incita ao racismo.

No último dia 04/11 (mas eu só li hoje) a Academia Brasileira de Letras convocou uma reunião para discutir o tema e a posição dos membros da instituição foi de rechaçar tal proposta. Como se pode ler no site da Academia, "a Casa manifestou repúdio contra qualquer forma de veto ou censura à criação artística" e declarou também que “cabe aos professores orientar os alunos no desenvolvimento de uma leitura crítica."

A mim o que parece chocante é a mudança dramática de discurso das pessoas que coordenam a educação neste país. Senão vejamos: quando descobriram o pré-sal, louvaram o autor pela sua luta em prol da exploração do petróleo. E Lobato também foi louvado quando, nos EUA, elegeram Barack Obama e todas as pessoas fizeram referência ao livro intitulado "O presidente negro ou o Choque das raças".

Agora que essas coisas já se converteram em notícia velha, decidiram que o autor não é mais digno de louvores e então aplicam uma leitura anacrônica e com pretensão de ser politicamente correta a um livro que ele escreveu. Como se Lobato fosse o culpado por toda a discriminação que existe no Brasil.

E o cúmulo do absurdo: post-mortem o autor precisa de defesa da ABL, Casa onde ele se recusou a entrar porque não fazia seu estilo estar sentado discutindo coisas. Lobato queria fazer coisas. E as fez muito bem. Eu  tenho só 24 anos, mas os livros dele também fizeram parte da minha formação e em nenhum momento me senti discriminado em minha condição de afro-descendente pelo fato de Tia Nastácia ser negra e às vezes receber um tratamento "racista" por parte dos meninos, de Emília ou de Dona Benta. Para mim, isso tudo é conversa fiada.

Em tempo: a imagem que coloquei neste texto é da edição da Editora Brasiliense, que lamentavelmente já não detém os direitos de publicação. Me recuso a colocar a capa da edição atual (da Editora Globo) porque o que eles chamam de "novo projeto gráfico" é, na minha opinião, um assassinato à obra do autor.

3 comentários:

  1. A questão da discriminação de cor, sexo, região etc no Brasil é um assunto que dá pano pra manga. Como você, cresci também com a obra de Lobato e nunca havia visto qualquer das histórias dele como racistas, ainda que em realidade pudessem ser. (Não parei para analisar qualquer de seus textos). O seu texto complementa um outro, também muito consistente, publicado no blog Canastra de Contos (link no meu blog). O problema do 'politicamente correto' é a estreita relação com a ideologia de quem, momentaneamente, esteja no poder ou tentando derrubá-lo. Para mim, polêmicas como essa são mais uma tentativa de desviar o olhar dos problemas crônicos sociais e educacionais do país. Ótimo artigo, Ailton. Parabéns!

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  2. Estamos vivendo uma fase de tentativa de purificação pela onda do politicamene correto. É como se tentassem acabar com os problemas, polêmicas, contradições eliminando quem as gerou. Ou algo como acabar com a pobreza eliminando os pobres. Isso já foi vivido em outro século e está ganhando força novamente. A sociedade está precisando de contraponto ideológico urgente. Muito bom, Ailton! Meu abraço. Paz e bem.

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  3. Oi Ailton,

    Passei por aqui porque queria deixar um recado pessoal e pedir sua autorização para incluir seu blog na lista de favoritos do meu. É que como te conheço, fica chato eu adicionar sem pedir... Esteja à vontade para manifestar sua vontade, tá? O endereço do blog é http://escriturasdeprazer.blogspot.com Não tem nenhuma pretensaõ literária, mas é que ultimamente ando escrevendo mais que o normal e resolvi colocar tudo no blog.

    Abraços! Carol

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